domingo, fevereiro 24, 2008

Hier Encore

Ver esta noite o espectáculo de Charles Aznavour foi sem dúvida o melhor final para o triste, decrépito e patético filme dos últimos dois dias. O amor é aquela fórmula química que salva vidas, cria sonhos, vence batalhas e faz cada um de nós estar aqui, esta noite. Mas quanto mal cozinhado transforma-nos em seres feios, amargos, capazes das maiores maldades que nem o mais profundo desamor justifica.

No entanto, ás vezes o destino dá-nos pequenos bálsamos para reciprocar a alma, e mesmo a maior dor turva e suja, não resiste quando a arte nos cresce diante dos olhos.
Charles Aznavour é o perfeito exemplo dessa forma de arte. Num espectáculo que deixou o pavilhão atlântico de pé e suspenso á sua voz, mostrou que a idade, a velhice é um pormenor sem a mais pequena importância quando o que se faz, é acima de tudo aquilo que se é.
Dono de uma voz bonita e marcada, é acima de tudo um homem de palavras, um actor num roteiro de viagens que transportava todos a momentos únicos de vida. Estava ali como se se tratasse de um velho amigo á mesa de jantar, partilhando histórias, piadas. Ás lágrimas nostálgicas que corriam pela face de quase todos os que me rodeavam, grandes e pequenos, eram poeticamente limpas não por kleenex a jeito no bolso, mas pelo seu humor, a sua dança. Um homem capaz de compor e cantar uma canção com as mãos, é digno de uma profunda admiração.
A energia deste homem de 80 anos, bonito, elegante, leve e cheio de graça fazia qualquer D’zrt morrer de vergonha. Durante 2 horas fez-nos rir, cantar, lembrar e conquistou muitos jovens acompanhantes de senhoras de idade avançada que suspiravam em meteorito.

Eu, que tive a sorte de ficar na fila da frente, fiquei encantada com o seu sorriso e com a forma como junta as palavras, naturais, simples, e nos conduzia a todos com jeitinho. De vez em quando confesso que senti o sorriso dele em mim, que retribuí com as covas do meu queixo bailarino e aspirante a cantor.

Ainda que muito se perca quando não se entende o francês, a beleza da sua melodia e aquilo que transmite com a forma intensa com que se canta, traduz da melhor maneira, o porque de ter sido considerado uma das maiores figuras do século.

3 comentários:

Anónimo disse...

“Reciprocar a alma!!!”? Charles Aznavour? ó Dra. Famalda (não me chame “amiga” que me põe....), que se passa contigo? E eu é que estou a ficar velho?
Confesso que desta é que eu não estava á espera...pensei que era mais Cure, The verve, Tindersticks...esta francófonia toda parece-me alguma doença rara que apanhaste...Vai mas é provar uns vinhos que sempre te fazem mais sorridente. Belas fotos, por sinal...
Beijo

Camaleão Vaidoso disse...

Risos...engraçadinho como sempre. Ainda bem que ainda te surpreendo, afinal de contas foi sempre esse o único atributo. Risos.
Vinhos sim...não fazem doer a cabeça e como não conduzo, não preciso de chamar o Nelson Piquet.

Beijos

Anónimo disse...

Minha Cara
Navegando pirata por esses por vezes tempestuosos, por vezes de calmarias mares virtuias, me deparo com o seu blog... Na verdade caçava eu o galeão pilotado por Monsieur Aznavour, sempre prenhe de dobrões sonoros... Porventura um dobrão em especial, "Ton Nom".. Mas não vem ao caso. Congratulações pelo título do blog. O "Fundo da Garrafa" na verdade parece ser onde reside nossas ansiedades ao perceber que o torpor dos co(r)pos chega ao fim.
abraços ... sopra uma brisa e devo aproveitá-la e seguir as ondas de bits e bytes