sexta-feira, setembro 14, 2007

Tira-linhas

Ando enrolada nas entrelinhas á procura de quem desate o novelo....

Encosta-te a mim...

Não quero que sejas perfeita. Não quero que saibas os poemas de Neruda de trás para a frente, em 5 línguas...não quero que tenhas o Nariz no seguro, que identifiques no escuro o bouquet da minha noite. Não preciso que sejas chefe de cozinha, com n estrelas mas de sorriso entravado. Não precisas ser bonita, nem alta, nem espadaúda e me faças vir só com o olhar.
Não precisas de existir...sempre...
só precisas de saber.De acreditar.
Tu para mim és perfeita...em todos os sentidos, obrigatórios, proibidos e afins.

Encosta-te a mim, nós já vivemos cem mil anos
encosta-te a mim, talvez eu esteja a exagerar
encosta-te a mim, dá cabo dos teus desenganos
não queiras ver quem eu não sou, deixa-me chegar.

Chegado da guerra,fiz tudo p´ra sobreviver
em nome da terra,
no fundo p´ra te merecer
recebe-me bem, não desencantes os meus passos
faz de mim o teu herói, não quero adormecer.

Tudo o que eu vi,estou a partilhar contigo
o que não vivi, hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim.

Encosta-te a mim,desatinamos tantas vezes
vizinha de mim, deixa ser meu o teu quintal
recebe esta pomba que não está armadilhada
foi comprada, foi roubada, seja como for.

Eu venho do nada porque arrasei o que não quis
em nome da estrada onde só quero ser feliz
enrosca-te a mim, vai desarmar a flor queimada
vai beijar o homem-bomba,
quero adormecer.

Jorge Palma
Crescemos pela vida a aprender a censurar os desistentes, aqueles que não alcançam, os que são os falhados aos olhos de tantos e nunca paramos para pensar que desistir é, não raras vezes a opção, não a única, mas a mais sensata, a mais prática, a melhor em prol de todos. A melhor.
Nos dias que correm, onde os minutos de ontem são feitos de uma velocidade de banda larga menores que os de amanhã, onde campanhas de informação nos mostram que não podemos ficar para trás, em que as doenças fatídicas ao cruzar da esquina são cada vez mais o prato do dia, em que aquilo que se come tem que ser feito rápido, em que os abraços aos amigos são num piscar de olhos, em que os cuidados com uma flor comprada á pressa são o único absorver da primavera...por toda esta tirania de minutos que se têm que viver ao máximo, porque não aceitar que por muita vontade, por muito que se queira o melhor, quando algo não funciona é devolver á proveniência ou guardar e seguir noutro caminho.

quinta-feira, setembro 13, 2007

A mão estende-se. O abraço rasga-se. O sorriso esconde-se.
Desisto.
Sinto-me coxa.

terça-feira, setembro 11, 2007

Tudo o que se disse


Primeiro foram as mãos que me disseram
que ali havia gente de verdade
depois fugi-te pelo corpo acima
medi-te na boca a intensidade
senti que ali dentro havia um tigre
naquele repouso havia movimento
olhei-te e no sol havia pedras
parámos ambos como se parasse o tempo
parámos ambos como se parasse o tempo
é tão dificil encontrar pessoas assim bonitas
é tão dificil encontrar pessoas assim bonitas
atrevi-me a mergulhar nos teus cabelos
respirando o espanto que me deras
ali havia força havia fogo
havia a memória que aprenderas
senti no corpo todo um arrepio
senti nas veias um fogo esquecido
percebemos num minuto a vida toda
sem nada te dizer ficaste ali comigo
sem nada te dizer ficaste ali comigo
é tão dificil encontrar pessoas assim bonitas
é tão dificil encontrar pessoas assim bonitas
falavas de projectos e futuro
de coisas banais frivolidades
mas quando me sorriste parou tudo
problemas do mundo enormidades
senti que um rio parava e o nevoeiro
vestia nos teus dedos capa e espada
queria tanto que um olhar bastasse
e não fosse no fundo preciso
queria tanto que um olhar bastasse
e não fosse preciso dizer nada
é tão dificil encontrar pessoas assim bonitas
é tão dificil encontrar pessoas assim pessoas



Pedro Barroso - Bonita

A caixa





Passeio por ela nos últimos dias, sem a olhar. Desejando que por não a ver ela deixasse de existir. Tive êxito na minha tarefa inglória de a ignorar por várias semanas. Mas ela continuava ali. Á espreita, á coca, aguardando o momento exacto para saltar e rir das minhas emoções.
Ontem, um sonambulismo mediocrê fez-me tropeçar nela e cair em mim. A caixa. Uma caixa tão igual a qualquer outra, tão cheia de objectos que são hoje vazios de sentido, ou meio-cheios de dorzinhas, agruras, saudades. Utensílios que já não assumem hoje o papel que lhes foi destinado, transformados pela vida em objectos de memória curta e silêncios longos.
Sabia o que a caixa continha e mesmo assim recusava-me a abri-la. Quis o destino que se abrisse ela por mim. Lá dentro vi um sentimento belo, profundo e real, que fora retalhado em peças solidificadas.
Cairam-me as pernas no chão duro que amparou a queda da minha esperança ingénua. Devolvera-me os pertences, mas tirará a bondade, a sinceridade, a candura. Devolveu-se um amor inacabado, a ternura.
Devolveu-se os presentes da nossa história, os adereços de um filme que se quis muito.
Como é possível que a dor cega e injusta, nos faça devolver a atenção e o carinho depositado num presente que se deu embrulhado em sentimentos do mais belo que a nosso coração produz. Também se devolve o beijo que se deu? Devolvem-se os abraços? Há direito de devolver os carinhos trocados? Devolve-se o sorriso que nos acorda? Devolve-se o querer quente, forte e doce que nos preenche?
!Quem dá e tira para o inferno gira!” dizia a minha avô . E quem recebe e devolve merece o que? O despeito? O desrespeito? O esquecimento?É como dizer – não gosto de me lembrar de ti e quero limpar-te como pó da minha vida.
Eu não me devolvo...e tudo o que dei me fez ser um pouco mais eu. Eu guardo os instântaneos de momentos que foram preechidos de coisas boas.
E a ternura não se devolve, não se divide, chega para todos. Nunca uma substitui a outra.

A minha caixa, tem chave, para se abrir sempre e deixar a ternura apanhar sol.